O transporte de cargas no Brasil foi o maior da história em 2021 e deve registrar um novo recorde em 2022. De acordo com dados preliminares de estudo inédito da consultoria Ilos - Instituto de Logística e Supply Chain, foram movimentadas 1,94 trilhão de TKUs - unidade que combina toneladas com quilômetros percorridos - em 2021, um aumento de 9,6% em relação ao ano anterior. Esse transporte representou um custo de R$ 1,09 trilhão, 16% superior ao verificado em 2020. O levantamento leva em consideração o movimento de mercadorias com origem e destino no país, somando todos os modais.
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) também registrou em 2021 um crescimento do setor de transportes, de 11,4%, ou seja, acima da expansão do Produto Interno Bruto (PIB) do país, que foi de 4,6%. Os dados do IBGE, no entanto, levam em consideração também o transporte de passageiros. Para 2022, a estimativa do mercado refletido no Boletim Focus do Banco Central de 25 de julho é de uma expansão do PIB brasileiro de 1,93%. “Se essa previsão se confirmar, a demanda por serviços logísticos crescerá entre 3% e 4%”, diz Maurício Lima, sócio-diretor do Ilos.
A expansão dos serviços de transporte de cargas encontra explicação em três fatores principais. O primeiro é o bom desempenho do agronegócio, com um crescimento previsto da safra na casa de 3% no ano. O segundo é o avanço das fronteiras agrícolas. A interiorização da produção amplia as distâncias percorridas no transporte de insumos e depois da safra.
Ao mesmo tempo, gera riqueza em novas regiões e o aumento da demanda por bens de consumo, que precisam ser levados aos consumidores locais que se encontram distantes dos principais centros comerciais. Entre 2020 e 2022, o número de operadores logísticos que passaram a atuar no Centro-Oeste cresceu 25%, no Norte, 19%, e no Nordeste, 15%.
O terceiro fator é o avanço do e-commerce, que cresceu 27% em 2021 com compras realizadas por 87,7 milhões de brasileiros, segundo dados da NielsenIQ/Ebit. A expectativa é de um novo crescimento nas vendas on-line na casa dos dois dígitos em 2022. “O e-commerce não é apenas a troca da venda física pelo on-line. Agrega novas etapas logísticas, como novos centros de distribuição regionais e a entrega da mercadoria na casa do cliente”, diz Lima.
Historicamente, o Brasil tem uma grande dependência do transporte rodoviário. Em 2021, o modal respondeu por 62% do movimento de mercadorias, constata o estudo do Ilos. O custo da operação rodoviária é fortemente impactado pelo preço do diesel, que nos últimos 12 meses até julho subiu em 68,30%. A Associação Nacional do Transporte de Cargas e Logística (NTC&Logística) calcula que o custo do transportador de carga fracionada - aquela com várias origens ou destinos - aumentou em 17,60% nos últimos 12 meses, enquanto o custo do transporte tipo lotação - carga com origem e destino único e longas distâncias, típica no agronegócio - subiu 31,05%. É um aumento significativo em um negócio que tem margem de lucro líquido perto de 5%.
“O primeiro semestre foi muito difícil, com várias transportadoras trabalhando no vermelho para manter os clientes”, diz Lauro Valdivia, assessor técnico da NTC&Logística. “A situação é pior entre os autônomos. Muitos estão vendendo seus caminhões e disputando vagas de emprego em transportadoras maiores.”
“O momento é de muita negociação entre os transportadores e os embarcadores [os contratantes] por reajustes nos fretes”, diz Pedro Moreira, presidente da Associação Brasileira de Logística (Abralog). Em média, os transportadores estão pedindo reajustes na casa de 10% a 15% nos fretes e as conversas não estão fáceis.
A perda de poder aquisitivo da população reduz a possibilidade de repasse dos reajustes do frete aos preços das mercadorias. Por outro lado, a oferta de infraestrutura logística no país é limitada, o que gera poder de barganha ao transportador. No final, avaliam os especialistas, o frete acaba sendo reajustado e repassado aos preços dos produtos, mas não sem antes gerar dois a três meses de duras negociações e prejuízos ao transportador.
Para Moreira, a situação só será alterada com expansão da infraestrutura e maior diversificação de modais logísticos, permitindo uma redução da dependência do transporte rodoviário. Enquanto o custo logístico representa 12,5% do PIB no Brasil, são 10% do PIB europeu e 8% do norte-americano. “Essa diferença representa ineficiência, devido principalmente a um excesso de dependência do transporte rodoviário”, afirma o executivo. “Podemos diminuir dois pontos percentuais deste custo em dez anos se o país investir em cabotagem, ferrovias e plataformas logísticas para o transbordo de mercadorias entre os modais”, avalia.
O universo das operadoras logísticas, empresas que realizam transporte em um ou mais modais, armazenagem e gestão de estoques, soma aproximadamente mil companhias no Brasil, que juntas faturaram R$ 166 bilhões em 2021. Os dados são de uma pesquisa do Ilos realizada em parceria com a Associação Brasileira de Operadores Logísticos (Abol).
São empresas que vivem realidades bastante distintas. Enquanto as maiores, com faturamento anual acima de R$ 601 milhões, apresentaram em sua maioria crescimento em 2021, ganhos de rentabilidade e fôlego para ampliar seus investimentos em tecnologia e inovação, entre as menores, com receita de até R$ 100 milhões, a situação não foi tão boa. Muitas não conseguiram repassar o aumento de custos, perderam receita e 32% delas tiveram redução da margem de lucro. “A tendência para o segundo semestre é que a demanda por serviços logísticos continue crescendo no país, mas ainda é muito cedo para avaliar se os custos vão se estabilizar e permitir uma retomada generalizada da lucratividade no setor”, diz Marcella Souza Cunha, presidente da Abol.