25/09/2020

A hidrovia e o desafio de ganhar relevância na matriz de transporte do país

 A hidrovia e o desafio de ganhar relevância na matriz de transporte do país


Evento contou com a participação do diretor do Departamento de Navegação e Hidrovias da Secretaria Nacional de Portos do Ministério da Infraestrutura, Dino Antunes, e da presidente da ABEPH (Associação Brasileira das Entidades Portuárias e Hidroviárias) e conselheira do Nordeste Export, Mayhara Chaves, com mediação do CEO do Fórum Brasil Export, Fabrício Julião. O diretor presidente e CEO da ABOL – Associação Brasileira de Operadores Logísticos e conselheiro do Brasil Export, Cesar Meireles, também participou do webinar



O Fórum Brasil Export e a ABEPH (Associação Brasileira das Entidades Portuárias e Hidroviárias) realizaram ontem, 24 de setembro, o 3º Webinar ENAPH (Encontro Nacional de Autoridades Portuárias e Hidroviárias), propondo para análise o tema “A importância da hidrovia na matriz de transporte do país”. O evento contou com a presença do diretor do Departamento de Navegação e Hidrovias da Secretaria Nacional de Portos do Ministério da Infraestrutura, Dino Antunes, e da presidente da ABEPH (Associação Brasileira das Entidades Portuárias e Hidroviárias) e conselheira do Nordeste Export, Mayhara Chaves, com mediação do CEO do Fórum Brasil Export, Fabrício Julião.

Em discussão, alternativas de projetar a hidrovia como real possibilidade logística para criar sinergia multimodal nas regiões brasileiras que demandem soluções mais engenhosas de acesso e opções de escoamento. Antunes trouxe para a audiência detalhes do projeto BR dos Rios, inspirado na BR do Mar, projeto que está garantindo protagonismo à cabotagem como variável para equações logísticas de grande eficiência.

“Tal processo começa a propor aos setores industriais e à sociedade sugestões e críticas sobre a conjuntura do setor hidroviário. Na coleta inicial de informações, identificamos duas vertentes: a primeira, de ordem específica, diz respeito a obras e problemas localizados, pertinentes à realidade de cada hidrovia, como, por exemplo, entraves estruturais, de segurança, de interferência com o setor e de geração de energia, entre outros. A segunda vertente, comum a todas essas hidrovias, relaciona-se ao fato de não termos um ‘dono’ de hidrovia, de não contarmos com uma adequada instituição à qual caberá a gestão das operações hidroviárias”, disse.

Na visão de Antunes, a atuação do DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes) – que vem se dedicando a dar fluência a uma série de ações fundamentais para o sistema hidroviário – ainda se concentra na execução de soluções pontuais em hidrovias específicas. “Não temos uma instituição que represente a integralidade do modal. Anteriormente, tentativas nesse sentido ocorreram com as já extintas administrações hidroviárias, mas sem sucesso, porque, se no papel deveriam funcionar como gestoras da hidrovia, promovendo a articulação com os usuários, no modelo das administrações portuárias, na prática acabaram transformando-se em repartições sem autonomia, atuando apenas na execução de obras mais simples – isso sem contar as questões adicionais que levaram a uma exacerbada (e, portanto, nociva) politização”, analisou.

O diretor do Departamento de Navegação e Hidrovias da Secretaria Nacional de Portos do Ministério da Infraestrutura voltou a enfatizar o impacto negativo da falta de uma instituição capaz de abranger a esfera pública e centralizar autorizações e procedimentos, também com uma representatividade mais efetiva aos usuários. “Não existe gestão das atividades hidroviárias, ou seja, uma autoridade que informe a empresa que está navegando, a embarcação, o nível de adequação em termos de capacidade e a operadora que tem prioridade na navegação, entre vários outros norteamentos imprescindíveis para a eficiência e a segurança. Temos vários rios plenamente navegáveis que já apresentam situações complexas quando se trata de formação de comboios, como uma eventual interferência de uma operação em outra, decorrente da proximidade entre os terminais”, pontuou.

Ele mencionou uma das ações já em curso para que a hidrovia aumente sua atratividade a potenciais investidores: estudos para avaliar a potencialidade de participação privada em manutenção e operação das hidrovias do Tapajós e do Madeira, comandados pela consultoria holandesa Royal Haskonings. A iniciativa faz parte de um memorando de entendimento assinado entre o Ministério da Infraestrutura e o Banco Mundial para colaboração em avaliações técnicas, de modo a melhorar a eficiência da logística de exportação e fomentar o desenvolvimento regional do Arco Norte, principalmente nos estados do Tocantins, Amazonas e Pará.

Segundo dados da ANTAQ (Agência Nacional de Transportes Aquaviários), em 2019 o volume de transporte em todas as hidrovias brasileiras atingiu 40,3 milhões de toneladas. Separadamente, registraram-se 10,9 milhões de toneladas (27%) no rio Tapajós e 9 milhões (22,4%) no Madeira, responsáveis por quase 50% do volume total movimentado. Tais dados demonstram inequivocamente a importância de um processo de PPPs (Parcerias Público-Privadas) na região.

Busca pela eficiência logística

Em sua fala durante o webinar, a presidente da ABEPH e conselheira do Nordeste Export enfatizou seu entusiasmo em resgatar a hidrovia e colocá-la no papel de evidência que lhe cabe. “Ficou muito claro o motivo de se resgatar o H da sigla da ABEPH. Com o passar dos anos, as administrações hidroviárias foram sendo muito politizadas, o que dificultou toda a situação. Ainda assim, continuamos a nossa luta, em razão da absoluta importância do tema. Ao associarmos a BR do Mar à BR dos Rios e a uma série de ações atuais do governo, continuamos engajados em reduzir o Custo Brasil e alavancar o setor logístico na sua plena eficiência”, comentou Mayhara Chaves.

Convidado a participar, o diretor presidente e CEO da ABOL – Associação Brasileira de Operadores Logísticos e conselheiro do Brasil Export, Cesar Meireles, pontuou a extrema complexidade do tema da hidrovia em consequência da extensão territorial do país, das particularidades das bacias hidrográficas e da desatualização das políticas relativas ao modal, somente para citar alguns pontos. “Faltou ao país coesão quanto ao desenvolvimento de políticas públicas amplas e convergentes para viabilizar de fato a hidrovia como opção logística. Tomemos como exemplo a hidrovia Tietê-Paraná, que não dispôs de um plano muito bem estruturado acerca do uso múltiplo das águas. A falta de equalização do uso das águas resultou na situação da Tietê-Paraná, hegemonicamente utilizada para a geração de energia, sem considerar as eclusas necessárias para a viabilização da hidrovia em maior escala industrial. Depois de décadas e décadas de incansáveis investigações, estudos e projetos, mantém-se a necessidade de construir tais eclusas para tornar possível o uso da hidrovia em escala comercial sustentável!”

Meireles citou ainda a hidrovia do São Francisco, conhecida como o “Rio da Integração Nacional”. “Quando se analisa essa hidrovia, que efetivamente tem um trecho de navegação mais extenso, entre Ibotirama (BA), a jusante, até Juazeiro (BA) e Petrolina (PE), por 560 km, concluiu-se que a esfera pública deveria ter mostrado uma dedicação bem mais efetiva quanto a políticas continuadas de viabilidade, mas acabou optando a favor da transposição do Rio São Francisco. Pois bem: o Rio São Francisco precisaria primeiramente ser recuperado ambientalmente, para então, vir a ser estudada a possibilidade ou não da transposição de parte de suas águas”, enfatizou.

Tendo coordenado o Plano de Fomento do Vale do São Francisco quando esteve no Governo do Estado da Bahia, entre os anos de 1997 a 1999, Meireles lembra que já naquela época os movimentos levavam à não transposição do Velho Chico, como é conhecido nacionalmente. “A transposição é, potencialmente um induto de morte ao Rio São Francisco, porque o rio está anêmico. Havia um padre em Juazeiro e Petrolina, Dom Luiz Cappio, que costumava dizer (sic) que um anêmico não pode doar sangue. Quem mora e vive do São Francisco percebe claramente que o rio está morrendo aos poucos. O mais importante para o planejamento sustentável das hidrovias é o estudo efetivo e amplo do uso múltiplo das águas, avaliando-se o estado sustentável do rio e a bacia hidrográfica na qual está inserido”, finalizou Meireles.

Integração

“Vivenciamos, efetivamente, a carência de políticas públicas que incluam as hidrovias nas plataformas e corredores de integração logística”, continuou o diretor presidente e CEO da ABOL. “De nada adianta tratar isoladamente as hidrovias se não buscarmos a sua interação em hubs, clusters e plataformas logísticas. Uma hidrovia não é um fim em si mesmo, mas sim uma via de escoamento integrada a outros modais. Se não for assim, não há atrativo para os investidores. A hidrovia precisa ter dono, quer seja a União, ou, por concessão, um ator privado, e seguir um modelo de gestão voltado à integração multimodal”, observou.

“Não precisamos reinventar a roda! Vamos estudar os modelos exitosos existentes lá fora. O Porto Aquaviário de Duisburg, na Alemanha, o maior porto fluvial do mundo (com capacidade operacional igual ao Porto de Santos, o maior complexo portuário do país), tem, em sua estrutura, o DIT (Duisburg Intermodal Terminal), o qual opera cerca de 20 mil barcaças por ano, está integrado a cinco autopistas e mais de 360 conexões ferroviárias por semana para mais de 80 destinos, o que corresponde a mais de 20 mil trens por ano”, registrou Meireles que esteve em visita técnica a Duisburg em 2014. “No entanto, iniciativas como a BR dos Rios nos permitem recobrar as energias e a esperança. É um passo necessário para colocar a hidrovia na agenda, como se deu com a cabotagem pela BR do Mar”, salientou Meireles.

Antunes concordou com as colocações feitas pelo diretor presidente e CEO da ABOL. “É o momento de colocar a navegação de interior sob os holofotes e conseguir criar massa crítica para trabalhar alguns de nossos obstáculos históricos, como, por exemplo, o uso múltiplo das águas. Necessitamos tornar essa discussão mais abrangente e expandir as fronteiras das hidrovias. A BR do Mar já teve um excelente resultado em trazer para o debate e para a agenda o setor de cabotagem. Queremos o mesmo com a BR dos Rios. Teremos uma luta multissetorial pela frente, com discussões profundas com outros setores, destacadamente o de energia. Acredito que o assunto não terá rápido tratamento na esfera governamental, mas vislumbro para 2021 a existência de algo substancial para ensejar o início de um detalhamento e o surgimento de propostas legislativas mais concretas”.

O evento contou também com as contribuições do diretor-executivo da ABTRA (Associação Brasileira de Terminais e Recintos Alfandegários), Angelino Caputo; do presidente do porto de Itaqui (MA), Ted Lago; do diretor da Eldorado Brasil Celulose, Flavio Costa; do diretor da Merco Shipping Marítima e conselheiro do Brasil Export, Aloísio de Souza Sobreira, do diretor presidente da ABTP (Associação Brasileira de Terminais Portuários), Jesualdo Silva, dentre outros, que levantaram questões sobre segurança jurídica e operacional para investimentos na estrutura hidroviária e benefícios oferecidos em caráter ambiental, como uma das poucas alternativas para mitigar os impactos da emissão de gases poluentes pela queima de combustíveis fósseis, além da significativa contribuição para harmonizar a matriz brasileira de transporte de cargas.

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