O agravamento da pandemia traz novas incertezas para a cadeia logística no país, mas os efeitos deverão ser muito menores do que aqueles vistos no auge da crise em 2020, segundo empresas do setor.A percepção é que o mercado aprendeu a lidar com a dinâmica cíclica da crise e que não deverão se repetir as turbulências vistas no ano passado, que levaram a um cenário de desabastecimento no país.
A Brasil Terminal Portuário (BTP), um dos maiores operadores de contêineres no porto de Santos, afirma que ainda não houve queda nos pedidos de importações, que inclusive seguem em alta, afirma o presidente da companhia, Ricardo Arten. Como as viagens marítimas são demoradas, há um certo atraso na percepção dos terminais. Ainda assim, o executivo avalia que, se houver retração, será transitória - uma percepção que não existia há um ano, no início da crise.
“Hoje, entendemos a pandemia como uma montanha-russa. Com a nova onda, há incertezas, talvez nos próximos meses tenhamos uma redução nos pedidos. Mas é uma situação que não vai perdurar. Esse foi um aprendizado que tivemos após um ano”, afirma o executivo.
Em 2020, a cadeia de suprimentos sofreu perturbações que levaram ao desabastecimento em diversos setores. Um dos problemas é que as companhias reduziram sua produção e deixaram de renovar estoques, diante da incerteza sobre como a demanda reagiria.
Porém, logo se constatou uma retomada no consumo, inclusive com a disparada na procura por eletrônicos, móveis e outros itens ligados à nova dinâmica de isolamento social. As empresas, porém, não conseguiram reagir a tempo diante desse descompasso entre oferta e demanda, o que levou à falta de algumas matérias-primas e produtos.
Os portos e empresas de navegação acompanharam o movimento de perto: entre março de julho do ano passado, foram canceladas 23 viagens de cargueiros vindos da China ao Brasil - o equivalente a pelo menos cinco semanas sem importações chinesas, segundo dados da Solve Shipping.No entanto, a partir do segundo semestre, com a reação da demanda interna, os pedidos passaram a aumentar intensamente. Desde então, os armadores têm recorrido a navios adicionais para dar conta do volume extra de importações.
“As pessoas deixaram de gastar com serviços, viagens, e passaram a gastar com produtos. Essa tendência deve continuar com a continuidade da pandemia”, afirma Luigi Ferrini, presidente da empresa de navegação Hapag-Lloyd. Por enquanto, a companhia também não sentiu efeitos da nova onda no Brasil e projeta que o fluxo de importações de contêineres seguirá firme nos próximos meses.
Uma diferença significativa entre as restrições atuais e as do início da pandemia é que, agora, as medidas têm um prazo limitado, avalia Cesar Meireles, presidente da Associação Brasileira de Operadores Logísticos (Abol).
“No início, as medidas de isolamento eram mais duras e não tinham data para acabar. Ainda que a situação seja mais grave atualmente, as janelas de restrição deverão ser menores, e a vacinação traz uma perspectiva. Por isso, não acredito que haverá uma descontinuidade substancial”, afirma Meireles.
Outro fator significativo é a disparada do comércio eletrônico, diz André Prado, da BBM Logística, que faz transporte de carga terrestre. “Já começamos a sentir uma redução no comércio de rua. Por outro lado, desde o ano passado observamos uma forte migração para as vendas on-line. O consumidor se adaptou aos novos canais, o que deu estabilidade”, afirma.
Outra diferença do cenário atual é que não há risco de um “apagão logístico” do país, diferentemente do início da pandemia, quando havia dúvidas sobre a continuidade da operação nos portos e estradas. Hoje, o governo e as empresas conseguiram consolidar o entendimento de que se tratam de atividades essenciais, que não podem parar.
Ainda assim, Prado afirma que, nas últimas duas semanas, começou a constatar entraves decorrentes das novas restrições, principalmente no Sul do país. São problemas ainda pontuais, mas que afetam a operação - por exemplo, a impossibilidade de concluir uma entrega porque o entregador não encontrou a loja aberta ou até mesmo a dificuldade para almoçar na rua.
Para grande parte das empresas do setor, outro grande fator de otimismo e tranquilidade é que as exportações de commodities continuam em franca expansão, independentemente de pandemia. A BTP, por exemplo, teve um aumento de 10% em sua movimentação no ano passado, mesmo com as dificuldades na importação.Outros grupos bastante ligada ao agronegócio, como Hidrovias do Brasil e Rumo, também não veem o atual agravamento da pandemia como uma preocupação para 2021.
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