A Câmara dos Deputados finalizou a votação do Projeto de Lei BR do Mar, que incentiva a navegação de cabotagem, isto é, entre portos nacionais. Por meio da ampliação da oferta de transporte marítimo, redução de custos, aumento da competitividade e atração de novos investidores, o programa pretende corrigir o subaproveitamento histórico do potencial aquaviário nacional. Elaborado por uma das ilhas de excelência do governo, o Ministério da Infraestrutura capitaneado por Tarcísio de Freitas, com a colaboração de setores interessados e técnicos do Ministério da Economia e da Marinha, o projeto conta com amplo apoio de associações, federações, sindicatos e outros representantes do setor.
O Brasil é um país continental, com imensos canais fluviais e cerca de 70% da população vivendo a 200 km de seus quase 8 mil km de costa. Apesar disso, o transporte aquaviário responde por apenas 11% da matriz logística, ante 65% do rodoviário. O uso excessivo do transporte rodoviário implica baixa produtividade no transporte de cargas, onerosidade da infraestrutura rodoviária, além de riscos de acidentes e mortes, e emissão de poluentes. Em contrapartida, o transporte aquaviário, sobretudo para longas distâncias, é mais eficiente, menos custoso, mais seguro e mais limpo.
Um dos pontos-chave do projeto é a flexibilização do afretamento, ou seja, do acesso a embarcações para empresas brasileiras de navegação. Os regulamentos atuais são demasiado restritivos e protecionistas, exigindo que a embarcação tenha bandeira brasileira ou seja tripulada por brasileiros. Muitas empresas de transporte têm de construir seus navios ou nacionalizar embarcações.
Outra opção é o afretamento “a tempo” de embarcações estrangeiras ou “a casco nu”, com as embarcações operando temporariamente sob a bandeira brasileira. Mas as restrições regulatórias impõem custos altos que limitam a oferta e os ofertantes ante uma demanda crescente. Além disso, a volatilidade do mercado internacional acarreta incertezas no valor do frete e disponibilidade da frota.
O projeto prevê a facilitação progressiva dos afretamentos. As empresas brasileiras poderão constituir uma subsidiária em outro país e fretar da própria subsidiária uma embarcação “a tempo”, com custos operacionais mais baixos. O projeto também prevê que, quatro anos após a sanção da lei, os afretamentos “a casco nu” poderão ser contratados sem que a empresa tenha embarcações brasileiras.
Além das facilidades no uso de embarcações de terceiros e aquisição de novas embarcações, o projeto prevê incentivos à indústria naval brasileira, em especial para a manutenção da frota, e para a modernização e ampliação dos terminais portuários.
Na última década a cabotagem tem crescido na ordem de 10% ao ano. Com o novo quadro regulatório, o governo prevê uma elevação de 40% na oferta de embarcações e 65% do volume de contêineres em dois a três anos, o que elevaria o crescimento da cabotagem a 30% ao ano.
Com o tempo, o novo regulamento também deve levar a uma melhor distribuição de portos. Hoje, entre os 175 portos do País, os de Santos e Paranaguá concentram 40% da movimentação. Entre os 10 maiores portos, apenas um está na Região Norte. Além disso, há 76 portos fora da costa, muitas vezes subutilizados.
Convém notar que a resistência corporativa de certos setores do transporte rodoviário não se sustenta. A parcela mais significativa do transporte de cabotagem é de petróleo, e não concorre com o transporte rodoviário. Quanto aos contêineres, a migração deve ser ínfima comparada ao volume total dos transportes por caminhão. Sobretudo, a cabotagem servirá para cobrir grandes distâncias, justamente as menos rentáveis, quando não impraticáveis, para os caminhoneiros. Assim, a relação entre o transporte rodoviário e de cabotagem é de intermodalidade, ou seja, muito mais de complementaridade do que de concorrência.
Um último ponto importante é que a maioria dos investimentos previstos virá do capital privado, aliviando os cofres públicos em uma época de restrições fiscais.
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