A disparada de 400% do preço do petróleo desde que atingiu US$ 19,33 - o menor patamar da pandemia, em abril de 2020 - tem provocado discussões em todo o mundo: como fazer para conter os efeitos desse aumento para os consumidores?
No Brasil, alguns projetos estão em discussão no Congresso. O Senado marcou para esta quarta, 23, a votação de dois deles, em uma tentativa de reduzir o impacto na vida das pessoas - um ponto especialmente sensível para o presidente Jair Bolsonaro em um ano eleitoral. Um dos projetos cria uma conta de estabilização de preços dos combustíveis. O outro altera o modelo de cobrança do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).
Esse, porém, não é um problema apenas brasileiro. Com o descasamento da oferta e da demanda de energia durante a pandemia - a produção recuou no início da quarentena e não acompanhou a retomada da demanda, que aconteceu mais rápido do que se previa -, o preço não só do petróleo, mas de diversas fontes explodiram. Assim, a energia se tornou um problema no mundo todo e governos passaram a adotar medidas não muito tradicionais.
“Temos visto economias de mercado enfrentando a crise com duas políticas: tributária e social. Os países estão dando subsídio e reduzindo imposto ou mudando a metodologia de cálculo do imposto”, diz Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE).
Para tentar conter a alta dos preços, nos Estados Unidos, por exemplo, senadores democratas pedem a suspensão do imposto federal sobre a gasolina até o fim do ano. No Japão, o governo está dando um subsídio para fornecedores de petróleo não passarem os reajustes aos consumidores e tem inspecionado postos de combustíveis para fiscalizar os valores que estão sendo cobrados.
Os países da Europa têm lançado mão de medidas para segurar não só o reajuste da gasolina, mas principalmente o do gás natural. Historicamente, o preço do gás tem uma espécie de indexação ao do petróleo. Hoje, porém, com a transição energética e diante do fato de o gás ser considerado uma fonte de energia mais limpa que o petróleo, seu preço tem avançado muito mais rapidamente. A crise entre a Rússia e a Ucrânia, que ameaça o fornecimento de petróleo, também pressionou ainda mais o preço do gás.
Para contornar o problema, a Polônia quer zerar o imposto sobre valor agregado (IVA) do gás. O país já reduziu a alíquota do tributo sobre combustíveis de 23% para 8%. Na França, onde os protestos dos “coletes amarelos” surgiram em 2018 após um aumento no diesel, o pacote inclui a venda de energia pela estatal a preços inferiores ao de mercado. O presidente Emmanuel Macron, que enfrentará eleições em abril, também reduziu impostos da conta de energia e congelou o preço do gás.
Na Ásia, a Tailândia diminuiu um imposto sobre combustível em 50% e estabeleceu um limite de preço de 30 baht (R$ 4,70) para o litro do diesel. A diferença entre o preço pago pelo consumidor e o do produto no mercado internacional é bancada pelo Fundo Estatal de Petróleo. Há, porém, um problema. O fundo está recorrendo a empréstimos para dar o subsídio, segundo informações do jornal Nikkei.
O entrave na Tailândia é apontado como uma dificuldade comum que os fundos de petróleo costumam enfrentar. Estabelecidos com recursos provenientes de impostos do setor ou de dividendos pagos por petroleiras, os fundos destinam recursos para subsidiar o combustível quando a cotação dispara no mercado internacional.
Na análise da diretora do Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP) Valéria Lima, não há casos de sucesso de fundos de estabilização no mundo. Isso porque os fundos têm dificuldade de restringir os momentos em que os recursos serão usados. “Não dá para tentar segurar um aumento no petróleo para sempre com o fundo. Ele precisa ser visto como algo temporário. Caso contrário, o recurso acaba.”
Para Valéria, hoje, a saída mais eficiente de curto prazo para a questão do combustível seria adotar subsídios para a população mais carente. A medida, diz ela, garante transparência e pode ser mais focada do que um imposto flexível, cuja alíquota reduz quando o petróleo aumenta e beneficia também os mais ricos.
Tanto Valéria como Adriano Pires veem na mudança no ICMS do combustível que está em discussão uma boa alternativa para o problema. Hoje, a cobrança utiliza um porcentual sobre o valor do preço, e não um valor fixo.
Fonte: Estadão
04/10/2024
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