Durante dois anos, André Maciel foi a ‘cara’ do SoftBank no Brasil. No período, o grupo japonês fez 25 investimentos em startups brasileiras e construiu um portfólio de respeito - entre os nomes estão Loggi, Creditas, QuintoAndar, Gympass, Buser, Olist, Vtex, MadeiraMadeira, Volanty e Banco Inter. Embora não tenha participado diretamente de todos os aportes, Maciel ajudou a desenhar - e a divulgar - a estratégia de um dos maiores investidores de tecnologia do País. Desde dezembro, porém, ele tenta alçar voo solo, encontrando oportunidades de investimento tecnológico onde os braços do SoftBank não alcançam.
Em parceria com Gregory Reider, ex-Warbug Pincus, e Milena Oliveira, ex-Pinheiro Neto, ele fundou a Volpe Capital, que acaba de fechar a captação de seu primeiro fundo. Em pouco mais de dois meses, a nova gestora - cujo nome significa raposa, em italiano - levantou um fundo de US$ 80 milhões e ainda espera outros US$ 20 milhões. A capacidade máxima do fundo será de US$ 150 milhões. Entre os investidores âncora estão o próprio SoftBank, o BTG e o Banco Inter - os três fundadores também se comprometeram a aportar 10% do valor do fundo em seu primeiro fechamento.
A ideia da Volpe é que o novo fundo invista nos próximos três anos em 10 a 15 startups por meio de cheques que variam de US$ 5 milhões a US$ 10 milhões. Segundo Maciel, os perfis das empresas podem variar, indo das que nunca passaram por uma rodada série A até aquelas mais próximas de um IPO. A oportunidade identificada pelo trio passa pelo tamanho dos cheques que pretendem fazer: são investimentos grandes demais para empresas muito iniciantes (no chamado early stage) e pequenos demais quando comparados aos investimentos feitos por grandes fundos de capital privado.
“Uma das minhas responsabilidades no SoftBank era investir em outros fundos. No período, foram investidos US$ 250 milhões em outros fundos. Com eles, percebi que havia oportunidades de mercado muito grandes, que comprovavam a minha tese de um fundo para cheques menores no Brasil”, diz Maciel ao Estadão. “A gente estava num mundo onde os cheques são grandes, e tem poucas companhias aqui no Brasil que procuram todo ano por cheques desse tamanho. Havia uma oportunidade onde o capital não é tão competitivo”, explica Reider.
Em termos de perfil de companhias a serem investidas, o trio também tem uma ideia bem clara quanto ao que procura. “Não estamos olhando para empresas com modelos de negócio de capital intensivo, como fintechs que oferecem crédito”, explica Reider. A ideia é que essas startups possam crescer sem a necessidade de muito dinheiro.
Dessa maneira, o fundo mira alguns dos setores que foram impulsionados no último ano, como os de comércio eletrônico e consumo, healthtechs (startups de saúde) e edtechs (startups de educação). A estreia dos aportes ocorreu justamente no setor de educação: no começo de março, a firma investiu uma quantia não divulgada no Uol EdTech, braço educacional do Grupo Uol.
Outra área que receberá atenção é a de SaaS (sigla para Software as a Service), que entrega plataformas de software para diversos outros setores, como o industrial, o imobiliário e o de logística. É um segmento que especialistas enxergam com bons olhos. “O Brasil ainda é muito ineficiente, então a empresa que faz melhorias via software tem um mercado muito grande”, diz Guilherme Fowler, professor do Insper.
Sob a ótica de plataforma, a Volpe também não descartará fintechs: embora a gestora não olhe para startups do setor financeiro que trabalham com crédito, aquelas que oferecem plataformas e marketplaces estão no radar de investimentos.
Diversificação\
Para Gilberto Sarfati, professor da FGV, a tentativa de abraçar diferentes setores pode passar uma mensagem inicial para o mercado de falta de clareza sobre aquilo que a gestora busca no País. “Healthtechs, por exemplo, é um setor muito complexo, com muita variedade”, diz ele. É algo que o trio tenta enxergar como uma aposta na diversificação.
“Estamos procurando um bom mix de empresas. Queremos aquelas que adaptam soluções globais para a realidade brasileira e empresas brasileiras que exportam tecnologia para competir na arena global”, diz Maciel. “Em edtechs e healthtechs, não é possível importar integralmente modelos de outros países. É preciso ver as necessidades locais. Já empresas de software podem lançar seus produtos fora do Brasil sem muita dificuldade”, diz.
“É importante que eles busquem diversificação, porque estão olhando para um segmento do mercado onde os riscos são maiores”, diz Fowler. O professor explica que empresas de tamanho médio não atingiram maturidade suficiente, o que significa que elas podem não conseguir entregar os resultados imaginados. Portanto, olhar para diferentes segmentos seria uma forma de proteger os investimentos. “Apesar de a Volpe estar sozinha no nicho, ela sabe que algumas startups podem não acontecer”, diz.
Outra carta na manga do trio é usar a experiência no setor no desenvolvimento das startups - atualmente, a equipe da Volpe conta com oito pessoas. “Estamos no meio do caminho entre private equity e venture capital. Ou seja, não vamos atuar no dia a dia da empresa, mas teremos uma participação importante na estratégia e no desenvolvimento”, diz Reider. “Queremos ir a fundo para ter a certeza de que não perderemos dinheiro”, diz.
“Na Volpe priorizamos trazer pessoas de backgrounds diferentes, que possam agregar na nossa análise de investimento. Acreditamos que a diversidade do nosso time auxiliará não apenas na construção de uma cultura mais forte e inclusiva, mas também em uma performance maior para os nossos investidores”, diz Milena.
“É impossível um fundo estrangeiro chegar no Brasil e montar uma equipe como a nossa”, diz Maciel. “É preciso conhecer bastante o mercado local”. Parece que esse é um galinheiro que as raposas da Volpe não querem deixar passar.
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