Ser o mais veloz merece um esforço que não envolve apenas atletas olímpicos. É um diferencial que pode levar o consumidor a escolher uma empresa ou outra no comércio eletrônico. Com um clique, milhões de reais mudam de mãos, em um mercado cujo faturamento atingiu R$ 87,4 bilhões no ano passado.
Não faltam motivos, portanto, para alguns dos maiores competidores em atividade no Brasil - Mercado Livre, Magazine Luiza e Americanas - promoverem uma disputa feroz pelo título de mais veloz na entrega dos produtos.
No primeiro trimestre, o faturamento do e-commerce acelerou 38,2% no país em relação ao mesmo período do ano passado, segundo pesquisa da Nielsen. As empresas investem cada vez mais na logística em transportadores, motoristas, galpões e centros de distribuição mais próximos dos grandes centros de consumo. Algumas já treinam o uso de drones para fazer as entregas.
A competição levou a um enfrentamento no Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar). Em 30 de novembro do ano passado, o Mercado Livre entrou com processo no órgão contra o Magalu e a Americanas. O Magalu reagiu e processou o Mercado Livre em 28 de janeiro deste ano.
O Conar é composto por representantes de anunciantes, agências, veículos, jornalistas e mídia digital, todos voluntários. Nunca, em seus 41 anos de existência, houve um veredicto desrespeitado ou revertido.
“É um exemplo que poderia ser seguido por outros setores da economia”, comenta o presidente do Conar, João Luiz Faria Netto. “Desafogaria a Justiça comum; os juízes são do ramo e é muito mais barato”. Para ele, o processo que as empresas de comércio eletrônico estão movendo é sintoma da concorrência.
“Todos estão se aprimorando e as diferenças são pequenas. Já tivemos processos semelhantes no passado na telefonia (sobre quem tinha a maior cobertura) e nos classificados dos jornais", diz Netto, um dos fundadores do Conar.
O primeiro julgamento pelo título do mais rápido foi concluído em 30 de junho, na Sexta Câmara do Conar (são oito). Todos os envolvidos dizem que venceram. No site do Conselho pode-se ler a decisão de que Mercado Livre, Magalu e Americanas foram obrigados a fazer alterações na mensagem “a entrega mais rápida”.
“Se todo mundo diz que é o mais rápido, alguém está falando um treco atrapalhado”, comenta mineiramente a conselheira do Conar Adriana Pinheiro Machado, relatora do processo. Seu voto obteve unanimidade dos conselheiros, na decisão de que era necessário esclarecer o consumidor segundo quais critérios uma empresa diz ser a mais rápida.
Em nota, o Mercado Livre diz que o Conar “reconheceu a possibilidade da empresa continuar a adotar o ‘claim’ entrega mais rápida do Brasil”, desde que inclua um esclarecimento “sobre os parâmetros utilizados para afirmar tal liderança”.
De maneira semelhante, Americanas informa que o Conar reconheceu que a empresa, na Black Friday de 2020, “oferecia a modalidade mais rápida de entrega em produtos e locais elegíveis”.
O Magalu bate na mesma tecla e afirma que a decisão do Conar “é clara ao permitir que a empresa continue a usar a expressão ‘entrega mais rápida do Brasil’, devendo apenas incluir informações da pesquisa que comprovam esse fato”.
“É uma discussão importante de linguagem”, observa a relatora nos processos Adriana Machado, “porque linguagem é a matéria-prima da publicidade e publicidade é um instrumento poderoso de convencimento do consumidor”.
Publicitária e professora, Adriana teve que examinar mais de duas mil páginas dos processos para fazer seu relatório. O fato de ser trabalho não remunerado não a incomoda: “É uma honra fazer parte do Conselho de Ética da minha profissão”.
“O consumidor está mais sofisticado”, comenta Faria Netto, “e as empresas também precisam ficar mais sofisticadas e sutis nas suas mensagens”. “O mundo é esse", conclui o jornalista, que dirigiu também a Associação Nacional de Jornais (ANJ), entre 1979 e 1984.
A diretora do Conar, Juliana Albuquerque, diz que não é incomum que os processos percorram todas as instâncias quando os reclamantes são empresas associadas e os litígios são a respeito de concorrência.
No caso da “entrega mais rápida”, a Americanas se deu por satisfeita com a decisão tomada em primeira instância e se retirou da disputa, ressaltando que o julgamento se deveu a um fato determinado - a Black Friday do ano passado.
Mercado Livre e Magalu recorreram da decisão da primeira instância. As duas companhias prometem apresentar documentos e pesquisas capazes de lhes garantir a primazia no uso do superlativo “o mais”.
O recurso será para que outra câmara do Conar mantenha ou mude a primeira decisão, em reunião que se dará provavelmente em setembro.
Caso a outra câmara não confirme o julgamento da primeira por unanimidade, Mercado Livre e Magalu podem fazer um recurso extraordinário ao pleno do Conselho de Ética, que tem mais de 200 integrantes.
As empresas associadas abrem em torno de 20% dos cerca de 300 processos instaurados anualmente no Conar. Os consumidores são os maiores reclamantes: abriram 68,5% dos 276 processos do ano passado.
A publicidade digital tem sido o maior alvo das reclamações. Em 2016, respondeu por 48% dos 308 processos que tiveram seguimento. Em 2017, a fatia foi de 53,7% de 300 processos; 63,6% de 324 no ano seguinte; 69,5% de 302 em 2019; e 73,5% de 276 processos no ano passado.
Para o presidente do Conar trata-se, em parte, de uma questão de educar continuamente o mercado publicitário. “Tem muitos jovens que nem sabem que o Conar existe e viram influenciadores no You Tube", afirma Faria Netto, “mas logo que uma decisão é tomada eles aceitam e passam a respeita-la. É importante para o negócio deles, é a publicidade que os sustenta.
Fonte: Valor Econômico
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