Parte da competitividade da produção agrícola se perde na logística para escoar a safra. Levar soja e milho do Brasil à China pode custar US$ 62,50 a mais por tonelada do que o gasto por seus concorrentes de Illinois, nos Estados Unidos. Estudo da Associação Nacional dos Exportadores de Cereais (Anec) com dados de março indica que os agricultores do Mato Grosso gastam em média US$ 103 por tonelada para levar grãos por caminhão até Santos (SP), um trajeto de 2.000 km, e outros US$ 35/ton no frete marítimo até a China, totalizando US$ 138/ton. Se a opção for encaminhar por caminhão e barcaças também por 2.000 km até Barcarena (PA), o custo é de US$ 82, e o frete marítimo até a China, totalizando US$ 138/ton. Se a opção for encaminhar por caminhão e barcaças também por 2.000 km até Barcarena (PA), o custo é de US$ 82, e o frete marítimo, de US$ 40. A conta fica em US$ 122/ton.
Em Illinois, o custo total é de US$ 75,50/ton (US$ 16,50 por 1.360 km terrestres e US$ 59 do navio). Os produtores de Córdoba, na Argentina, utilizam trem e navio para colocar grãos na China gastando, ao todo, US$ 79 por tonelada. “Pagamos um preço caro pela falta de infraestrutura logística adequada”, afirma Elisangela Pereira Lopes, assessora de infraestrutura da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). Para a especialista, o produtor agrícola brasileiro precisa de corredores multimodais para escoar sua produção, com ferrovias e hidrovias e trajetos rodoviários de no máximo 500 km.
A infraestrutura do Sul e Sudeste atende as necessidades básicas, mas precisa ser melhorada, diz ela. O problema é maior no Centro-Oeste, Norte e Nordeste do país, nas áreas acima do paralelo 16ºS, que corta o Brasil do sul de Mato Grosso ao sul da Bahia. Acima dessa linha a produção cresce de 9,4% ao ano há mais de uma década. Em 2023, a região respondeu por 69% da produção nacional de grãos.
As reivindicações dos produtores são conhecidas, como a melhoria da navegabilidade das hidrovias dos rios Madeira, Tapajós e Tocantins por meio de dragagem, sinalização e balizamento das vias e derrocamento de rochas. “O transporte hidroviário reduz em 30% o valor do frete”, diz Lopes. “Mas, por falta de infraestrutura adequada nas hidrovias, durante as vazantes as barcaças trabalham com uma redução de 30% a 50% de sua capacidade, eliminado a vantagem.”
Entre as principais obras ferroviárias para atender a região está a Ferrogrão, projeto polêmico pelo potencial de impacto ambiental que liga Sinop (MT) aos portos fluviais do rio Tapajós em Miritituba (PA). Outras reivindicações são a conclusão da Ferrovia de Integração Centro-Oeste (Fico) ligando a Ferrovia Norte-Sul em Maria Rosa (GO) até Vilhena (RO), e a construção dos trechos 1 e 2 da Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol), de Figueirópolis (TO) a Ilhéus (BA).
Essas obras estão incluídas no novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC 3) - e estavam nas versões anteriores do programa. Para o setor, elas atendem as reivindicações. “A questão é saber se serão de fato executadas”, afirma Lopes. De acordo com levantamento da Inter.B Consultoria, apenas 10% das obras de infraestrutura do PAC 1 e 31,6% das obras do PAC 2 foram concluídas.
“Não há uma perspectiva positiva para novas obras ferroviárias no curto ou médio prazo”, diz Frederico Turolla, sócio da consultoria Pezco Economics. O problema, avalia, é o risco político, que afasta investidores privados. O momento é de desconfiança gerada por incertezas em relação a estabilidade fiscal e intervencionismo, como a decisão do governo Lula em rever contratos de renovação antecipada de concessões ferroviárias assinados na gestão anterior.
A avaliação sobre a viabilidade dos investimentos em hidrovias depende da definição do modelo que será proposto, se concessões das vias ou parcerias público-privadas (PPPs). Outra hipótese é o governo fazer as obras, o que esbarra no limite orçamentário.
Enquanto não avança com as obras estruturantes, o governo amplia os recursos para o plano anual de escoamento da safra. Os desembolsos cresceram 82% em 2023, para R$ 3,6 bilhões. Neste ano, a previsão é investir R$ 4,7 bilhões. “É um programa de obras emergenciais que visa evitar ocorrências graves que afetem o escoamento da safra”, diz Lopes. “Cumpre o propósito, não estamos tendo problemas no escoamento da safra, mas enfrentamos custos elevados”.
Fonte: Valor Econômico