Custos menores, maior segurança e ganhos com descarbonização são vantagens que estão incentivando a adoção, cada vez mais acelerada, da navegação por cabotagem pelos grandes embarcadores de mercadorias no país, especialmente do setor industrial. Segundo pesquisa realizada pelo Instituto de Logística e Supply Chain (Ilos) com 86 das maiores indústrias do Brasil, 38% delas disseram que pretendem aumentar o uso da cabotagem no transporte dos seus produtos até 2025.
Hoje, apenas 13% de toda carga transportada no país é feita pela navegação de cabotagem, enquanto o modal rodoviário na matriz de transportes se mantém acima de 60%. “A maior disponibilidade de navios e frequência das viagens, combinação com outros modais de transporte e menor consumo de combustíveis abrem perspectivas de maior participação da cabotagem no transporte de cargas nos próximos anos”, avalia Maria Fernanda Hijjar, sócia-executiva do Ilos.
A ArcelorMittal, uma das maiores produtoras de aços do país, acaba de inaugurar um modal de transporte por barcaça, para viabilizar a ligação entre a planta de Vega, em Santa Catarina, e o Nordeste, com o transporte de bobinas laminadas a frio e revestidas. O ciclo se inicia na unidade de Pecém (antiga Companhia Siderúrgica do Pecém), em Fortaleza (CE), adquirida pela ArcelorMittal em 2022, produtora de placas, que envia coque e placas a serem laminadas a quente pela unidade de Tubarão, no Espírito Santo.
De lá, as bobinas laminadas a quente são enviadas para a unidade de Vega, em São Francisco do Sul (SC), onde são laminadas a frio e revestidas. No retorno ao Ceará, as embarcações são carregadas de bobinas laminadas a frio com destino a Pecém, de onde os produtos são distribuídos no mercado do Nordeste, fechando o ciclo.
“Trata-se de um modelo logístico inédito de transporte de produtos de aço e insumos por navegação, aproveitando a sinergia entre as três grandes plantas de aço instaladas no litoral brasileiro e com acesso aos portos”, diz Eduardo Raya, diretor de planejamento e logística da ArcelorMittal no segmento de aços planos.
No ano passado, o total movimentado nos portos, em operações de embarque e desembarque de produtos, dentro da costa brasileira, atingiu 290,1 milhões de toneladas, segundo informações da Agência Nacional de Transporte Aquaviário (Antaq). “Transportamos mais de 1,2 milhão de contêineres na cabotagem”, indica Luís Fernando Resano, diretor-executivo da Associação Brasileira dos Armadores de Cabotagem (Abac).
Só na região Sul, são 3,5 mil contêineres transportados por mês pela navegação de cabotagem, sendo que 60% desse volume é de arroz para o Norte e Nordeste, informa Carlos Bacchieri Duarte, vice-presidente de infraestrutura da Federação de Entidades Empresariais do Rio Grande do Sul (Federasul).
Além de ser uma alternativa mais econômica, a navegação de cabotagem também se destaca pela sua eficiência e menor impacto ambiental, analisa Luiza Bublitz, presidente da Aliança Navegação e Logística, empresa do grupo global de serviços de transporte marítimo Maersk. “A cabotagem integrada viabiliza o transporte planejado de grandes quantidades de insumos e produtos de forma segura, com grande abrangência geográfica e de forma sustentável”, diz. Segundo ela, a emissão de CO2 é pelo menos quatro vezes inferior à do transporte rodoviário de carga, considerando a mesma distância.
Para Resano, da Abac, esse modal é a solução estratégica para um país continental, com seus 8,5 milhões de quilômetros quadrados de extensão. “Estamos retomando o ritmo de crescimento registrado pouco antes da pandemia do coronavírus”, diz ele. Mas ainda faltam maiores estímulos ao desenvolvimento desse modelo de transporte, considera. “A Lei 14.301/22, que foi criada em 2022 para baratear e incentivar a cabotagem no país, até hoje não foi regulamentada.”
Segundo Dino Antunes, secretário Nacional de Hidrovias e Navegação do Ministério de Portos e Aeroportos, no entanto, essa regulamentação não vai demorar muito mais para sair: “Finalizamos a discussão com a iniciativa privada e dentro do próprio governo, e a expectativa é termos o decreto aprovado nos próximos meses”. A intenção, afirma, é estabelecer regras claras para dar segurança jurídica ao setor e permitir que os empresários façam cálculos e adotem as melhores formas da cabotagem.
Fonte: Valor Econômico