10/09/2024

Brasil perderá oportunidade se não aprovar mercado de carbono em breve

 Brasil perderá oportunidade se não aprovar mercado de carbono em breve



 brasileira Luiza Demôro é chefe global de transição energética da Bnef, o braço de pesquisas da Bloomberg. De Londres, ela coordena a produção de dados ligados à descarbonização em todo o mundo e conversar com investidores de vários países.


Ela recebeu a Folha na sede da Bloomberg em São Paulo, onde enfatizou a necessidade de o Brasil tomar de imediato a dianteira das discussões climáticas, aproveitando a presidência do G20 neste ano e da COP no ano que vem.


O Brasil está atrás dos países desenvolvidos na produção de hidrogênio verde?


Não, mas as políticas públicas precisam avançar. A nossa síndrome de vira lata é muito grande; a gente se vende muito mal porque achamos que somos piores do que todo mundo e isso não é verdade. A gente precisa olhar em volta e entender que comparado com a maior parte dos países, principalmente os emergentes, estamos muito à frente.


O que é necessário em termos de política pública para incentivar a produção de hidrogênio verde?


Precisamos de sinais que trazem mais confiança ao investidor, como direção de onde o país quer ir a longo prazo, com mais firmeza em termos de oferta e demanda. São planos claros que dão segurança ao investidor de qual o tamanho da demanda para uma solução específica. A nova NDC (compromisso de redução de emissões de carbono) do Brasil, por exemplo, pode ter indicações claras, não necessariamente de qual a solução vai ser aplicada, mas de onde o país de fato quer chegar.


Os leilões de renováveis, por exemplo, tinham sucesso porque o governo dava uma direção clara de longo prazo, e o investidor sabia exatamente onde ele estava pisando.


Estamos preparados para exportar produtos de valor agregado para países desenvolvidos?


A gente sabe que a demanda da Europa, por exemplo, vai existir, porque eles não vão conseguir suprir a própria demanda no longo prazo, mas o Brasil vai precisar lidar com barreiras relacionadas à infraestrutura e transporte e também precisaremos ter mais clareza do impacto dos subsídios dos países desenvolvidos sobre o produto brasileiro.


Por exemplo, o hidrogênio brasileiro tem capacidade de ser o mais competitivo do mundo, mas quando se considera os subsídios dos EUA e da Europa, essa competitividade cai. Mas como a Europa não vai conseguir suprir toda a sua demanda, eles vão precisar ir para o mercado externo. Então, se somos um dos mais baratos sem subsídios, somos competitivos.


O Brasil tem condições de subsidiar essa produção?


No momento que alguma tecnologia específica passa a ficar interessante para a economia, os incentivos mudam, mas hoje não está nas projeções.


Há quem diga que hidrogênio verde é solução importada e que, no caso do Brasil, o melhor seria utilizar o biometano. Também é a sua opinião?


Para que consigamos chegar ao net zero em 2050, precisaremos levar em consideração todas as tecnologias e soluções disponíveis, e elas vão variar de país a país. Um desafio é a escala; existem tecnologias que hoje são mais baratas, mas quando outras começam a escalar o preço começa a cair muito rápido e as que eram mais baratas não ficam tão competitivas. Mas, no Brasil, todas as soluções precisam ser consideradas e aplicadas.


O governo não precisaria escolher uma solução para dar incentivos fiscais?


O ideal são incentivos para um objetivo e não para uma tecnologia específica; caso contrário você acaba com a competitividade de outras soluções, principalmente na descarbonização da indústria. A gente se distrai muito nas conversas de quem ganha e quem perde, sendo que essa não é a direção para fazer com que a economia se descarbonize.


Uma das direções seria aprovar o mercado de carbono, hoje parado no Senado?


Não avançar com o mercado de carbono muito em breve vai ser perder a maior oportunidade para o Brasil. A gente tem potencial de ter o maior mercado e de mais alta qualidade do mundo, e isso tem potencial de transformar a economia brasileira. A gente está agora só com o mercado voluntário, suprindo o Brasil e o mundo, mas quando você passa a ter um mercado regulado, você coloca regras no jogo que vão aumentar a demanda e que vão aumentar o preço e isso impacta também o mercado voluntário de créditos de carbono.


Por que tem travado?


O problema do mercado de carbono é que muitas das regras foram feitas por países desenvolvidos e não por países em desenvolvimento ou por países tropicais, então precisamos tropicalizar essas regras para trazer credibilidade e qualidade para o mercado. Estamos presidindo o G20 e, no ano que vem, a COP, então essa é a oportunidade única para a gente direcionar os holofotes globais para o Brasil. A gente precisa usar esse momento para que o mundo entenda o Brasil de verdade, não o caricato. O mundo precisa entender nossas dificuldades com desmatamento, por exemplo.


O que é tropicalizar o mercado de carbono?


É entender a realidade das florestas e do agronegócio do Brasil. Você não consegue criar um mercado de alta qualidade de carbono se você não entende quais são as causas reais que estão afetando a qualidade de crédito.


Mas essa sua tese só faz sentido se os créditos de carbono forem aceitos como forma de compensar as emissões, o que tem sido contestado.


Esse talvez seja o tema mais complexo de clima da atualidade, porque ele envolve interesse de muitos lados e é um tópico sem fronteira. Então, de fato, a oportunidade do Brasil depende de todas essas partes movendo na direção que seja favorável. E, portanto, se é interesse do país, o momento de influenciar a comunidade global é agora. Se deixar passar, não teremos mais a possibilidade.


Explorar petróleo na foz do Amazonas prejudicará a imagem global do Brasil como líder da transição energética?


Esse sinal me preocupa, porque em uma época em que o clima ficou tão importante para o Brasil e se fala tanto em nova industrialização, isso não seria bem visto. Me preocupa também porque no momento que o país pega a presidência da COP, os holofotes se voltam e a imprensa global foca em apontar todos os fatos que não se alinham com o que o país está propondo, e esse com certeza vai ser um deles. Não vamos sair ilesos disso.


Fonte: Folha



Notícias Relacionadas
 Veículos autônomos devem movimentar US$ 45 bilhões no transporte de cargas até 2034

18/07/2025

Veículos autônomos devem movimentar US$ 45 bilhões no transporte de cargas até 2034

O uso de veículos autônomos no transporte de cargas deve ganhar escala nos próximos anos. Segundo a consultoria Precedence Research, o mercado global de entregas autônomas na etapa last (...)

Leia mais
 BBM aposta em ganhos de agregados para avançar crescimento, reduzindo custos

16/07/2025

BBM aposta em ganhos de agregados para avançar crescimento, reduzindo custos

A BBM Logística, um dos maiores operadores logísticos do Brasil, decidiu apostar na expansão do número de motoristas agregados, com aumento incentivado de seus ganhos, para ampliar prese (...)

Leia mais
 Entidade aciona Justiça para tirar privilégio dos Correios no governo Lula

15/07/2025

Entidade aciona Justiça para tirar privilégio dos Correios no governo Lula

A Associação Brasileira de Operadores Logísticos (Abol) acionou a Justiça recentemente pedindo a suspensão de um decreto do presidente Lula, de 2024, que dá “preferência” à contratação d (...)

Leia mais

© 2025 ABOL - Associação Brasileira de Operadores Logísticos. CNPJ 17.298.060/0001-35

Desenvolvido por: KBR TEC

|

Comunicação: Conteúdo Empresarial

Este site usa cookies e dados pessoais de acordo com os nossos Termos de Uso e Política de Privacidade e, ao continuar navegando neste site, você declara estar ciente dessas condições.