Dados publicados por consultorias e empresas parceiras de varejistas mostram que a Black Friday superou as estimativas de vendas em lojas e no on-line e atingiu a maior alta em quatro anos. Esse desempenho pode abrir espaço para resultados mais positivos no Natal, quando redes e indústrias conseguem rentabilizar melhor suas vendas, alcançando margens maiores.
Entre a quinta-feira (28) e a manhã deste domingo (dia 1º, até as 6h59), o faturamento nominal no on-line avançou 11% frente ao ano anterior, para cerca de R$ 8 bilhões, segundo a empresa de serviços e dados Neotrust Confi, responsável por uma das pesquisas mais tradicionais na data.
A projeção inicial era de alta menor, de 9,1%, já considerando nessa estimativa o efeito da base de comparação fraca de 2023. Na semana passada, as consultorias e associações setoriais ouvidas pela reportagem projetavam elevação de 5% a 10%, a depender do estudo.
Em 2022 e 2023, os números ficaram abaixo do projetado. Em 2021, a venda em novembro chegou a cair 4,2%, de acordo com a pesquisa do comércio do IBGE.
No sábado (30), a aceleração foi mais forte, de 22% sobre a mesma data de 2023, com R$ 1,93 bilhão faturados. Em unidades, o avanço foi de 21%. Na sexta-feira (29), dia oficial da Black, a expansão no digital alcançou 8,4%, logo, dentro das projeções de mercado. A pesquisa foi feita em parceria com a ClearSale.
Segundo cálculos do Valor, a alta de 2024 é a maior taxa de expansão do on-line na Black desde 2020, quando a crise sanitária isolou os consumidores em casa e os obrigou a se abastecerem na internet.
Foi um crescimento sustentado pelo aumento de volume de pedidos, de 12% de quinta-feira a domingo, para 14,4 milhões, segundo a Neotrust Confi. O valor gasto por compra praticamente não subiu, com alta de 0,8%, para R$ 555,17, portanto, com queda em termos reais, ao descontar a inflação.
Nesse patamar de gasto médio, entram segmentos como moda e alimentos, menos dependentes de crédito e com menor efeito da recente alta dos juros na economia.
As lojas físicas, que nem sempre vão bem mesmo quando o digital cresce na Black, pode ter tido um ano mais animador na data.
De acordo com a Linx, uma das maiores fornecedoras tecnologia ao comércio, os pontos de venda de moda e calçados tiveram alta de 13% na semana das promoções. Isso ocorreu após as plataformas asiáticas, como Shein, terem sido taxadas em 20% nas importações abaixo de US$ 50, em lei válida após agosto. Na sexta, a alta na receita foi de 23%.
O pagamento da primeira parcela 13º salário na sexta-feira da Black, algo que não ocorria desde 2019, explica, em parte, o desempenho nas lojas e no digital. Desde início do evento no Brasil, em 2010, em apenas três anos (2013, 2014 e 2019) o pagamento do 13º ocorreu na sexta.
Para dois executivos de redes de eletrônicos e moda ouvidos, ações comerciais “mais controladas”, ou seja, com ofertas que se esgotavam no mesmo dia que subiam nos aplicativos, ajudou a gerar um efeito positivo na demanda. “O brasileiro já entendeu que se ele perder a promoção naquele dia, ela não volta”, diz uma das fontes.
Outro material, da NielsenIQ Ebit, uma das maiores consultorias em consumo, relata alta mais discreta no faturamento do canal digital na sexta, de 6,2% - mais perto do piso das projeções.
Mesmo com maior pressão das dívidas sobre o orçamento dos brasileiros, consultores acreditam que teve peso positivo nos números a estabilidade na inadimplência, os ganhos de renda das famílias e a alta no emprego formal em 2024. Segundo o Banco Central, a inadimplência de crédito das famílias em 12 meses está estável. A massa de rendimento médio real subiu 7% de julho a setembro.
As reclamações contra as empresas, no entanto, bateram recorde. E a alta foi superior à expansão nas vendas, o que indica que, proporcionalmente, há mais pessoas frustradas com a compra.
Foram 14,1 mil reclamações na sexta-feira, maior número já visto, e 16,5%, acima do verificado entre a quarta-feira e a sexta-feira da Black de 2023, segundo o Reclame Aqui.
Procuradas, Amazon e Sephora, esta última com ações muito agressivas no evento, não se manifestaram. O Magalu informou que ampliou equipes de atendimento, que atendem de forma ininterrupta. E afirma que mantém índice de solução acima de 80% no sistema nacional de defesa do consumidor.
Para Matheus Manssur, superintendente da ClearSale, o foco maior das empresas em ações comerciais em itens que são de consumo rotineiro (vendidos em farmácias, supermercados e no atacarejo) favoreceu a alta nas vendas, e disseminou o efeito da Black pelo comércio.
Nessa conta, entra também o efeito dos “marketplaces puros”, que são empresas apenas de venda on-line, focadas em itens de lojistas, como Mercado Livre e Amazon, e que historicamente avançam acima da média do digital na data. Entre 23 e 28 de novembro, o marketplace da Shopee vendeu três vezes mais do que em 2023.
Na sexta-feira, Fernando Yunes, vice-presidente do Mercado Livre, disse que a empresa crescia acima da média de 9% do mercado naquele momento, sem informar a sua taxa. A JSL, empresa de logística, que trabalha para Mercado Livre e Shopee, entre outras, projetou avanço de 30% nas entregas.
Pelo levantamento da Linx (do grupo StoneCo), as vendas do on-line subiram 4% na sexta-feira frente a 2023. Durante a semana, a alta alcançou 5%, dentro do piso das projeções.
No caso dos marketplaces, diz a Linx, na sexta-feira houve aumento de 24% no faturamento em comparação com o ano passado. Entre os dias 25 e 29 de novembro, a receita subiu mais, cerca de 45%.
Para o executivo Abel Ornelas (ex-Casas Bahia e ex-Carrefour), é preciso verificar se a Black foi rentável. “Os custos do evento são altos, e precisa ver se isso foi pago ou se ficaram no prejuízo. No Natal, será a hora de rentabilizar, de efetivamente ganhar mais margem.”
Como o Valor antecipou na semana passada, existiam sinais de melhora da demanda desde o começo do mês. A principal dúvida do mercado é se esse ritmo permanece no Natal, já que parte da população antecipa as compras na Black. Ainda pesa nessa conta um eventual risco de repasses nos preços da alta do dólar, que pode encarecer mercadorias que estão sendo encomendadas para a venda.
Fonte: Valor Econômico