Passados dois anos de pandemia, os fretes no transporte marítimo de carga seguem em patamar recorde. Por um lado, executivos e analistas do setor avaliam que os preços no mercado de curto prazo estão próximos de seu pico. Por outro, a persistência da crise sanitária ainda gera incertezas e dificulta previsões.
Hoje, no Brasil, as rotas mais afetadas pela alta de preços são a de importação vinda da Ásia e de exportação para os Estados Unidos. Nos últimos dois meses, os trajetos para a Europa também têm apresentado crescimento acentuado. O impacto, porém, é generalizado, já que a crise é fruto de uma desordem global no comércio marítimo.
Desde 2020, o transporte de cargas vive uma “tempestade perfeita”: equipes desfalcadas devido à infecção pelo vírus, fechamento e congestionamento de portos, gargalos no escoamento interno da carga. Tudo isso em meio a uma disparada na demanda por bens de consumo - em muitos países, fomentada por estímulos governamentais. Esse descompasso tem levado a uma escassez de contêineres e de navios, atrasos nas viagens e um avanço inédito dos preços.
Na rota de importação China-Brasil, o frete começou a escalar no segundo semestre de 2020, mas foi no ano passado que chegou a seu patamar recorde, na ordem de US$ 10 mil por contêiner de 20 pés. Em dezembro de 2021, o preço médio foi de US$ 9.700 por contêiner. Trata-se de uma alta de 62% em relação ao mesmo mês do ano anterior e um aumento acumulado de 397%, desde janeiro de 2020, segundo levantamento da CNI (Confederação Nacional da Indústria).
Nas rotas de exportação para os EUA, a alta de preços se acelerou no segundo semestre de 2021. O frete no trajeto até a Costa Leste da América do Norte encerrou 2021 em US$ 9.300 por contêiner de 20 pés, mais de cinco vezes o preço de um ano atrás. Na rota até o Golfo dos Estados Unidos, o valor encerrou o ano em US$ 7.700, contra US$ 1.400 em 2020, aponta a CNI.
Estes valores se referem ao mercado de curto prazo, e não incluem preços de contratos bilaterais (firmados entre empresas de navegação e clientes). Neste tipo de acordo, as companhias que precisam transportar seus produtos conseguem mais estabilidade e proteção contra a oscilação de preços. Por isso, se considerado todo o mercado (e não apenas o de curto prazo), os preços caem de forma significativa. Por exemplo, na rota de importação Ásia-Brasil, o frete médio foi de US$ 5.794 por contêiner de 20 pés, em novembro de 2021, segundo cálculo da Logcomex.
Para Luigi Ferrini, vice-presidente sênior da empresa de navegação Hapag-Lloyd, a avaliação é que o mercado “spot” (de curto prazo) já atingiu os preços máximos. “Tanto em importação quanto em exportação, chegamos ao teto”, afirma. Neste momento, quem está sentindo as altas são os grupos que estão renovando seus contratos anuais com os armadores, diz. As renegociações têm incorporado a alta de preços registrada em 2021.
Já na avaliação de Andrew Lorimer, presidente da consultoria Datamar, ainda há espaço para algumas elevações de preço. “Pode piorar um pouco. Os principais motores da crise hoje são a oferta chinesa e a demanda norte-americana. E os problemas nesses casos devem persistir. Na China, temos visto paradas por conta da variante ômicron. E nos EUA, ainda há gargalos logísticos, um enorme congestionamento nos portos”, afirma.
As indústrias já começam a vislumbrar uma acomodação dos fretes, mas em patamar considerado alto, afirma Matheus de Castro, especialista em infraestrutura da CNI. “É desafiador fazer uma perspectiva de retomada da normalidade, pelo comportamento da pandemia. Mas começamos a ver uma estabilização em algumas rotas, ainda que com valores cinco, seis vezes mais altos.”
A queda no consumo brasileiro, paradoxalmente, tem contribuído para essa acomodação, ao menos no lado da importação, por ajudar a equiparar a relação entre oferta e demanda, segundo Rafael Dantas, diretor comercial da empresa de logística Asia Shipping. “O pico já passou. Acreditamos que, neste ano, o volume de importações vai desacelerar. Isso já está acontecendo, dezembro não foi tão aquecido quanto em 2020. Com isso, para nós, a situação está próxima do normal”, afirma.
Ele também destaca, porém, as incertezas trazidas pela nova onda da pandemia - principalmente na China, onde as medidas de isolamento são mais drásticas.
Para Rafael Gehrke, da Logcomex, será possível ter uma visão mais clara sobre a possível estabilização dos preços a partir do segundo trimestre, quando terão passado os efeitos do Ano Novo chinês, no início de fevereiro - feriado que tem um impacto grande na movimentação de carga, com aumento das viagens antes e depois da data, em que as atividades no país ficam paradas.
“A partir do segundo trimestre, outros fatores também poderão estar mais desenhados, como a reação da demanda interna no Brasil ou um possível aumento de juros nos EUA, que pode frear um pouco o consumo”, diz.
Para os analistas, é difícil prever em qual patamar os fretes se estabilizarão uma vez que o cenário se acalmar. Na visão de Castro, da CNI, é difícil imaginar que os preços voltarão ao nível da última década. Para Ferrini, da Hapag Lloyd, a expectativa é que haverá uma regularização em valores intermediários, entre os atuais e os anteriores à pandemia, considerados muito baixos.
Apesar da dificuldade de projeção, Lorimer, da Datamar, considera os preços atuais insustentáveis. “Boa parte da inflação do último ano tem a ver com o custo do transporte, que impacta toda a cadeira. Muitos produtos, como os de menor valor, não se sustentem com um frete tão alto.”
Fonte: Valor Econômico
27/11/2024
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