Não é de hoje que a logística de transporte e escoamento de produtos no Espírito Santo demonstra não explorar todo o seu potencial. As malhas rodoviária e ferroviária têm se mostrado insuficientes para atender aos portos capixabas tanto na exportação quanto na importação – situação grave num estado cujo grau de abertura da economia fechou em 42% no ano passado, índice bem maior que a média nacional, que foi de 27%. De acordo com o Instituto Jones dos Santos Neves (IJSN), esse indicador capta a inserção da economia local no mercado internacional.
Em 2023, enquanto o Brasil registrou queda de -4,32% no comércio exterior, no Espírito Santo essa atividade cresceu +3,75%, alcançando a cifra de US$ 19,3 bilhões – foram US$ 9,5 bilhões exportados (crescimento de +4,17% sobre 2022) e US$ 9,8 bilhões importados (incremento de +3,34% ante 2022). O dado consta na Resenha da Balança Comercial Preliminar, do Instituto Jones dos Santos Neves (IJSN), e o valor é o maior da série histórica anual.
Especialistas ressaltam que o estado tem grande potencial portuário, mas falta atenção e investimento na ampliação de rodovias e ferrovias para alcançar os terminais. Como essa infraestrutura é subdesenvolvida, produtos que poderiam ser escoados pelo Espírito Santo acabam indo para portos de outros estados.
“Os portos e aeroportos regionais oferecem grande potencial ao estado mas, ao mesmo tempo, lidamos com a inexistência de eixos viários estratégicos e a ausência de viadutos e elevados urbanos, que facilitariam bastante o transporte terrestre por aqui”, opinou o economista Antônio Marcus Machado.
“O caminho é desconcentrar a atividade produtiva e consumidora da Grande Vitória, valorizando mais o interior, o turismo e investindo nas estradas. E, mesmo que lenta, há uma estratégia desenhada nesse sentido, com investimento na economia criativa. Mas o estado precisa de mais mão de obra qualificada para a elaboração de projetos logísticos”, completou o especialista.
O engenheiro mecânico e especialista naval José Ernesto Conti acredita que o grande gargalo é incentivar os agentes públicos e privados a levarem a sério a capacidade portuária instalada para alavancar as exportações pelo Espírito Santo.
“Temos a Estrada de Ferro Vitória a Minas, que tem uma capacidade de transportar em torno de 10 milhões de toneladas de carga por mês, e hoje só transporta 6 milhões, o que significa que há um grande potencial para aumentar a quantidade de produção exportada.
Mesmo com portos e terminais operando com certa ociosidade e sem bons equipamentos modernos, ainda há espaço para um grande crescimento”, analisou o especialista.
Conti aponta que falta investimento em estradas e em ativos ferroviários, como locomotivas e vagões. “Pelo porto da Imetame, que está sendo construído em Aracruz, poderemos embarcar quatro tipos de carga: contêineres, grãos, petróleo e carga geral.
Para que ele seja eficiente, o governo precisa melhorar as rodovias: a BR-101, que nos liga ao norte e ao sul, a BR-262 e a BR-259, que ligam o estado ao oeste.
O governo também deve usar seu poder moderador da concessão para que a Vale e a VLI, responsáveis pelas ferrovias, invistam em ativos para aumentar o volume de carga para os portos”.
A Federação das Indústrias do Espírito Santo (Findes), em apoio ao governo do estado, demonstrou por meio de estudos o potencial capixaba para a exportação e a necessidade de investimentos logísticos.
“As economias para o setor produtivo do país, com o aumento da capacidade e plena utilização do corredor ferroviário Centro-Leste, ultrapassam a casa dos R$ 120 bilhões nos próximos 30 anos. Isso mostra como a infraestrutura e capacidade de serviços logísticos do Espírito Santo pode alavancar o desenvolvimento do Brasil, de forma sustentada e eficiente, com baixos custos e dinamismo para o produtor nacional”, argumentou o consultor de infraestrutura e energia da Findes, Luís Claudio Montenegro.
Montenegro explica que a indústria capixaba pode crescer além do mercado nacional, fortalecendo as parcerias potenciais com cadeias produtivas globais para comércio em larga escala e altíssima competitividade nos mercados de todo o mundo. “Podemos ser referência, como as grandes economias asiáticas que também se apoiaram no mesmo modelo. Nesse contexto, é preciso muito investimento para que as infraestruturas logísticas e a capacidade energética do estado estejam disponíveis para esse gigantesco salto produtivo que estamos muito próximos de vivenciar”, concluiu.
Falta de investimentos em logística atrasa evolução do ES
Novo Plano Nacional de Logística prevê investimentos de R$ 480 bi até 2035
O governo federal, por meio do Ministério da Infraestrutura, anunciou um novo Plano Nacional de Logística (PNL) que chegou a ser disponibilizado para audiência pública em 2021. Entre investimentos públicos e parcerias privadas, foram estimados R$ 480 bilhões em aportes até 2035, sendo R$ 21,7 bilhões aplicados em cabotagem – aumentando, assim, a cabotagem em 13% Tonelada Quilômetro Útil (TKU), medida que considera volume e distância percorrida.
O PNL projetou ainda um aumento de 37% em TKU no volume de cargas. O percentual transportado por ferrovias foi estimado em 21,5%. O estudo prevê cenários em que o transporte ferroviário poderá chegar a representar até 35% das cargas transportadas no país.
A expectativa é que a demanda por carga conteinerizada para rodovias e ferrovias continue crescendo, tendo como solução a implantação de terminais hidroviários. Segundo a então Secretária de Fomento, Planejamento e Parcerias do Ministério da Infraestrutura e atual diretora interina da Agência Nacional de Transportes Terrestres, Natália Marcassa, o PNL serve de base científica para que a pasta consiga aprovar e priorizar projetos.
A secretária usou como exemplo uma demanda antiga do governo do Espírito Santo: a renovação antecipada da concessão da Ferrovia Centro-Atlântica (FCA), com um novo contorno na região mineira da Serra do Tigre. Assim, o volume de carga que chegaria ao estado seria ampliado.
“Uma análise com base nos critérios do PNL, que levam em conta aspectos econômicos e sociais, mostra que o investimento proposto pelo governo para utilização dos recursos da outorga da FCA, a construção de parte da Ferrovia de Integração Oeste-Leste III, leva a um retorno econômico de R$ 1,2 bilhão a mais que o investimento na Serra do Tigre. O planejamento de longo prazo vai dar uma maior previsibilidade para a execução de projetos do setor ao longo dos anos, o que era um pedido do mercado”, explicou Marcassa.
O próximo passo é a consulta pública dos planos setoriais para rodovias, ferrovias, portos e hidrovias, que deve ser lançada em breve.
Comitê de Crise em ação para solucionar entraves
Em março, diferentes atores do mercado logístico e portuário no Espírito Santo participaram de uma reunião com o vice-governador do estado, Ricardo Ferraço, para debater possíveis soluções. No final do encontro, foi criado um Comitê de Crise para dar continuidade à discussão.
O presidente do Centro Brasileiro dos Exportadores de Rochas Ornamentais (Centrorochas), Tales Machado, pediu um olhar atencioso do governo do estado para os principais gargalos da exportação das rochas pelo Porto de Vitória e pelo Terminal de Vila Velha. Vários empresários detectaram dificuldades na movimentação de contêineres.
De acordo com Laurent Van der Voo, diretor comercial da MSC do Brasil, empresa global de transporte de contêineres, há uma crise global dos contêineres de 20 pés, devido à alta demanda e aos conflitos geopolíticos. A expectativa é de que a situação será controlada com a chegada de navios carregados com contêineres vazios.
Já o TVV enfrenta, principalmente, uma grande ocupação de sua capacidade. O próximo passo é a negociação da ampliação da área do terminal junto à Vports.
O recém-formado Comitê de Crise já voltou a se reunir para sugerir um plano de ação ações para reduzir o tempo de espera para a entrada dos contêineres nos portos, que pode chegar a sete dias.
Fonte: ES Brasil