As políticas governamentais, os custos e a economia fechada são alguns dos empecilhos que tornam difícil a relação entre o Brasil, Estados Unidos e Europa. Foi com essa análise que o palestrante internacional Dales Rogers, professor norte-americano de negócios da Universidade do Estado do Arizona, finalizou a sua apresentação na abertura do segundo dia do Fórum ILOS 2022, chamando a atenção do público e alertando sobre a necessidade de mudança. A 28ª edição do evento, organizado pelo Instituto de Logística e Supply Chain, teve início no último dia 18 e seguiu até o dia 20 com painéis, exposição de cases e mesas redondas realizadas em São Paulo e com transmissão online via plataforma do próprio encontro.
“O Brasil tem grandes recursos, inovação, gente bem treinada, universidades de primeira categoria e alguns dos melhores profissionais da cadeia de suprimentos. Poderia ser um tigre no mundo, porém está sempre muito fechado em si mesmo. Os problema são as políticas governamentais e o custo brasileiro é muito difícil. As regulamentações fecharam a economia do País. Apesar de nunca estarmos muito amigáveis com o governo chinês, do ponto de vista de business, é mais fácil lidar com a China do que com o Brasil”, destacou Rogers, sendo lembrado por especialistas em outras palestras, diante da relevância dessa observação. O professor esteve à frente do painel “Rupturas em Supply Chain”, trazendo informações sobre disrupções vividas pelo setor ao longo dos últimos seis anos.
Incêndios em fábricas, pandemia e a guerra da Ucrânia foram algumas das mudanças que impactaram significativamente as demandas, apontou o especialista. “Há vários tipos de quebras que estão nos intrigando. Situações climáticas extremas no Arizona, ondas de calor piores do que costumavam existir. Estamos vendo falta de commodities, dificultando a compra de veículos. De 2021 para 2022 todos esses tipos de disrupções aumentaram. Os incêndios em fábricas cresceram 200%. Estamos sentindo isso nos EUA, mas está acontecendo numa escala global”, disse Rogers.
Diante desse cenário, o professor menciona um novo conceito, o da plasticidade para lidar com esse processo de transformação. Segundo ele, não basta ser resiliente, é necessário ser plástico e mudar a estrutura das operações. Diversificar fornecedores e geograficamente foi uma das soluções levadas pelo docente. “Se houver um colapso, precisamos medir qual o tempo necessário para nos recuperarmos. É muito interessante visualizar o mapeamento da cadeia de suprimentos para se garantir em relação aos riscos. Melhorar a visibilidade é fundamental, ainda que pareça caro, pois não tê-la pode ser ainda mais oneroso. Vemos que a logística está crescendo, mas as coisas ainda são desconhecidas em relação a suas tendências”.
Novo normal na logística
A atual fase da cadeia de suprimentos dentro do chamado “novo normal”, assim como a relevância da gestão de riscos, foram destaque na visão de outros especialistas e executivos ao longo das palestras do segundo dia do Fórum. O presidente da Multilog, Djalma Vilela, por exemplo, chegou a defender um rearranjo da cadeia “depois de tudo o que passamos”, durante a mesa redonda, que encerrou as atividades deste dia 19. Ele dividiu o palco com representantes da Unilever, Raia Drogasil, Sanofi e Meditronic, que se posicionaram a favor de estudar e conhecer as cadeias com mais profundidade. Para eles, é essencial uma gestão de conhecimento para antecipar planos de mitigação e não serem pegos de surpresa.
O chairman da Tompkins Venture, James A. Tompkins, trouxe uma “nova conscientização” da cadeia de suprimentos na sua palestra “A jornada Supply Chain”. De acordo com o escritor, antes de 1970 a logística era um termo militar. De 1991 a 2005, passou a ser vista como um mal necessário. Já de 2006 a 2020, foi verificado que o transporte era um custo considerável e gerava alta preocupação às empresas. A partir de 2020, os termos logística e supply chain se aproximaram, fazendo com que essa conectividade repercutisse numa certeza de que vai além de uma despesa. “Nesse mesmo período, a pandemia levou as pessoas a respeitarem o papel essencial da cadeia para comprarem o que precisam”, explicou Tompkins.
Para ele, o presente conturbado leva os envolvidos a repensarem abordagens logísticas da cadeia de suprimentos, o novo normal e a tão falada disrupção. “Isso gera oportunidade perpétua e conforme chegamos nesse estágio é que o futuro será drasticamente diferente do passado. O novo normal se tornou uma norma de incerteza e quando temos isso precisamos responder de forma diferente, com nova filosofia de liderança, uma revisão da visão, ambiente mais dinâmico. Entre 2020 e 2021 tivemos 10 anos de disrupção em dois anos. Temos que identificar as ondas e encontrar a certa para navegarmos”.
Última Milha
Para aliar teoria e prática, algumas empresas levaram cases de sucesso ao Fórum com soluções relacionadas, sobretudo, ao e-commerce e à última milha, que se tornou um dos focos diante das exigências do consumidor após a crise sanitária. Uma delas foi a RoutEasy, startup que oferece soluções 360 no segmento, aposta em inteligência artificial e machine learning em software próprio para oferecer excelência aos seus mais de 300 clientes. A ferramenta foi desenvolvida após o diagnóstico de que entregas não realizadas no horário previsto, emissão de CO2, distância percorrida e tempo de roteirização estão entre as principais dores das companhias de logística. O case levado ao Hotel Tivoli foi o criado para atender o Grupo Pão de Açúcar (GPA) no projeto de same day delivery, ou seja, entregas no mesmo dia. A logtech contribui para a nova era do e-commerce, possibilitando entregas expressas e reduzindo os prazos de envio.
No painel “Ciclologística: Inovação e sustentabilidade para revolucionar cidades”, o diretor de negócios da Tembici, Rafael Szarf, falou sobre a busca das empresas por modelos de entrega mais baratos e sustentáveis. “Comparando os 10 quilômetros percorridos com motorizados, a bicicleta elétrica é 40% mais rápida e economiza 264 horas ao longo do ano em grandes cidades, o equivalente a um dia por mês. Um dia a mais de performance é bom para a cadeia inteira”, ressaltou Szarf, lembrando ainda que a bicicleta é um ativo ocupado fulltime, devido ao seu compartilhamento. Segundo ele, há seis viagens por dia em média sendo feitas pela mesma bicicleta. “Se tem last mile e quer algo mais eficiente, rápido e sustentável é o modelo que pode colaborar com save de todas as empresas”.
A Whirlpool trouxe detalhes da revisão da sua malha logística e estratégia de transportes. O objetivo foi reforçar o posicionamento das marcas, chegando no destino final com prazo adequado e bom custo logístico. "Tínhamos um modelo de distribuição centralizado, mas começamos a observar o varejo crescendo, consumidores se espalhando e nosso custo logístico aumentando. Pensamos, será que estamos com o melhor modelo de malha? Para manter o nível de serviço competitivo e o custo adequado tivemos que nos transformar”, explicou o diretor de logística, Carlos Oba.
O projeto utilizou a pirâmide logística como framework, abordando as diferentes vertentes, que se consolidam no nível de serviço oferecido ao cliente. Os pontos envolvidos foram: nível de serviço, demanda, clientes, centros de distribuição, armazenagem, estoques, fábricas, incentivos fiscais e transportes. “Tivemos um envolvimento grande de todas as áreas, todos com propósito de um melhor atendimento ao consumidor. Foram guiados pela pela vontade de chegar mais rápido ao ponto final. Foi uma governança muito forte, com indicadores, reuniões diárias, semanais e um resultado gratificante”.