As últimas semanas deixaram claro que o cenário para os leilões de rodovias não está nada favorável, o que poderá jogar um balde de água fria em grande parte dos diversos projetos em curso no setor. A situação preocupa, considerando que quase todos os governos tem apostado na iniciativa privada para tirar obras importantes do papel e mesmo para garantir a manutenção de estradas.
O pacote de leilões rodoviários de 2022 impressiona quem acompanha o setor. Há ao menos nove licitações previstas para este ano, com R$ 80 bilhões de investimentos. A percepção é que há projetos demais, em um intervalo de tempo muito curto.
Desde o início deste ano, já foram suspensos ou adiados os leilões da BR-381, entre Minas Gerais e Espírito Santo; três projetos rodoviários de Minas e, agora, o Rodoanel Norte de São Paulo — que, mesmo em um formato de Parceria Público Privada (PPP), com aportes do governo, e previsão de fluxo intenso, não conseguiu atrair interessados. O único leilão que se viabilizou foi um lote no Rio Grande do Sul, conquistado por um consórcio de empresas de engenharia, que foi o único a apresentar oferta.
Uma série de fatores levaram a essa situação. Nos últimos meses, o que têm pesado mais é a alta inflação dos insumos de construção (agravada com a guerra na Ucrânia) e o aumento da taxa de juros no Brasil.
A pandemia também tem um peso grande. A crise sanitária, que afetou diretamente o fluxo de veículos nas estradas, levou ao adiamento de uma série de leilões, que poderiam ter sido distribuídos de forma mais espaçada. Depois, veio o impacto do custo da construção, principalmente a partir da segunda metade de 2021.
Além disso, a promessa de entrada de novas empresas estrangeiras no país não se cumpriu, e alguns operadores tradicionais não têm disputado os leilões — por exemplo, Arteris e Pátria (desde que este venceu o leilão do corredor Piracicaba-Panorama). CCR e Ecorodovias têm sido ativos, mas seletivos, já que estão com muitos compromissos em curso.
O saldo dos projetos neste ano tem confirmado previsões de alguns analistas. A primeira é que leilões de menor porte bem estruturados seriam aqueles com maior potencial de sucesso. A segunda é que a expansão do número de operadores não virá de fora, mas pela associação de grupos locais menores.
Apesar dos desafios, ainda há expectativa de que parte dos leilões de maior porte marcados para 2022 consigam se viabilizar, dado que há diversos ativos interessantes e que poderão atrair inclusive concorrência, a depender da modelagem.
Porém, o cenário também gera dúvidas quanto ao alcance de um programa de concessões que, mesmo extenso e com diversos projetos bem estruturados, tem tido dificuldade para viabilizar obras importantes - e, em um momento de crise, gerar empregos, impulsionar a produtividade e melhorar a logística do país.
Seria apenas uma questão de ajustar as modelagens, atualizar os estudos e adequar as condições? Ou será preciso encontrar espaço e construir uma governança para voltar a ampliar os investimentos públicos em infraestrutura? O momento parece propício para o debate, principalmente em ano eleitoral.
Fonte: Valor Econômico