29/10/2020

Novo perfil de consumo exige redefinições na área de entrega

 Novo perfil de consumo exige redefinições na área de entrega


Empresas ampliam o grau de fracionamento de cargas nas operações

Induzida pela mudança de hábitos do consumidor na pandemia, a explosão do e-commerce provocou forte impacto em toda a cadeia logística do país. Fechadas em casa, as pessoas passaram a comprar quase tudo exclusivamente on-line, forçando um rearranjo geral entre os diversos segmentos logísticos e na própria estratégia das empresas, que tiveram que se estruturar rapidamente para atender à intensa demanda do comércio eletrônico. E quem ainda não participava desse canal, passou a fazê-lo ou a se prepara para isso.

A ordem agora é chegar o mais próximo possível do consumidor para entregar os produtos em menor tempo possível, conceito chamado de “last mile”, ou última milha logística. “O impacto foi enorme. A gente teve que se reinventar”, diz Plínio Pereira, vice-presidente de operações para o setor de consumo da DHL Supply Chain Brasil.

De janeiro a agosto, o número de pedidos no comércio digital cresceu 65,7%, em relação a mesmo período de 2019, conforme dados da Associação Brasileira de Comércio Eletrônico (Abcomm). No primeiro semestre, as vendas chegaram a crescer 145%. Estima-se que sua participação no varejo tenha passado de cerca de 5% para em próximo de 8%.

O perfil da movimentação de cargas mudou. De grandes volumes para poucos pontos passou a poucos volumes - carga fracionada -, para uma infinidade de pontos, as casas dos consumidores. “Ainda temos transporte de grandes volumes, mas houve uma inversão, a maior parte agora é de pequenos volumes”, afirma Pereira.
Até começo do ano passado, as operações logísticas se concentravam no mercado B2B, entre empresas, com cerca de 50% do total referentes a movimentações entre indústria e varejo e 30% relativos ao suprimento de linhas de produção da indústria. As entregas até o consumidor final não passavam de 20%, destaca Paulo Resende, coordenador do núcleo de infraestrutura, supply chain e logística da Fundação Dom Cabral (FDC).

“A grande novidade dos últimos dois anos foi o deslocamento para maior atuação B2C, principalmente no caso do comércio eletrônico, que aumentou mais com a pandemia”, explica Resende.

A mudança foi imposta pelo consumidor, cujo desejo é receber o produto em casa o mais rápido e da melhor forma possível, quer a compra seja feita na loja virtual do varejo ou do fabricante, nos marketplaces ou redes sociais, o chamado comportamento omnichannel, ou de múltiplos canais. Como resultado, as empresas tiveram que deslocar seus estoques para pontos mais avançados, mais próximos do consumidor final, para que os produtos estejam disponíveis para entrega em poucos dias ou até em poucas horas.

“Prazo é vital na internet”, diz Maurício Lima, sócio diretor do Ilos Instituto de Logística e Supply Chain. O comércio on-line envolve uma logística sofisticada, para coletar rápido e enviar, descreve o especialista. Exige digitalização e integração do supply chain, para operar com um grau de fracionamento muito maior, um ambiente que já vinha se definindo antes da pandemia. “A covid acelerou esse processo e as empresas tiveram que se adequar para acompanhar essa realidade”, diz Lima.

O primeiro efeito da pandemia foi de queda nas operações, entre abril e maio, com exceção dos segmentos de alimentação, saúde humana e animal e higiene e limpeza, onde o movimento se intensificou e se mantém aquecido. Os mais afetados foram o automotivo, de produtos da linha branca e de eletroeletrônicos. De junho em diante o comércio digital passou a dar as cartas, aquecendo as vendas de quase tudo e impondo a relação direta entre operadores logísticos e o consumidor.

“Essa nova tendência é irreversível”, acredita Cesar Meireles, diretor presidente e CEO da Associação Brasileira de Operadores Logísticos (Abol). Os operadores intensificaram a atuação nesse mercado, redefinindo estratégias e associando-se a novos parceiros para segurar os custos e manter a competitividade. Muitos uniram-se a empresas de marketplace, elas próprias interessadas em participar da operação logística. “Várias dessas empresas se associaram rapidamente a operadores para realizar as entregas de forma célere”, relata Meireles.

No segmento das transportadoras, depois de uma queda que chegou a 45,2% em maio, o volume de carga movimentada já recuperou-se e muitas empresas ultrapassaram os níveis de antes da pandemia, informa Francisco Pelucio, presidente da Associação Nacional do Transporte de Cargas e Logística (NTC&Logística). “O comércio eletrônico cresceu muito, aumentando o volume transportado. Teremos ainda uma safra recorde e isso também ajudará a recuperação do transporte”, prevê Pelucio, alertando, porém, que ainda permanecem incertezas relacionadas à continuidade da pandemia.

Agilidade e criatividade foram decisivas para acompanhar as mudanças no mercado. Mas são insuficientes para enfrentar os antigos entraves da infraestrutura, que eleva os custos logísticos e pode comprometer uma recuperação mais robusta da economia depois da pandemia. Predominante na matriz de transportes, o modal rodoviário convive com a situação precária das estradas. Em 10 anos, até 2019, enquanto a frota de veículos cresceu 74,1%, a malha rodoviária aumentou só 0,5%, conforme pesquisa da Confederação Nacional dos Transportes (CNT). A condição das rodovias piorou. No ano passado, 59% foram avaliadas como regulares, ruins ou péssimas. Em 2018, esse percentual foi de 57%.

Nos últimos 30 anos, o investimento médio anual em logística de transporte ficou abaixo de 0,8% do PIB brasileiro. Nos últimos dez anos, caiu para 0,5%. Na avaliação de Paulo Resende, da FDC, esse percentual precisaria aumentar para 2,5% do PIB, no mínimo, pelos próximos dez anos.

A infraestrutura urbana é outro gargalo, que começa a desafiar as entregas do comércio eletrônico. As obras de mobilidade previstas na época da Copa do Mundo e Jogos Olímpicos, de 2014 e 2016, ficaram pelo caminho. “Nunca houve tão pouco investimento no aparelhamento das cidades para a mobilidade urbana”, afirma Resende.

As periferias das capitais vivem um crescimento desorganizado. Conjuntos habitacionais são construídos de forma descontrolada porque a lei de uso e ocupação de solo não se integra a planos de mobilidade urbana. “Com a infraestrutura regredindo, aumentou a complexidade logística para distribuir os produtos do comércio eletrônico”, aponta Resende.

Para Plínio Pereira, da DHL Supply Chain, o e-commerce poderá chegar em pouco tempo a 15% de todo o varejo. “Precisamos ter muita agilidade e flexibilidade para acompanhar a nova dinâmica”, afirma.

Além de rearranjar parcerias na busca por centros de distribuição (CDs) menores e localizados em regiões antes pouco exploradas, a empresa criou soluções como a modalidade Rodo Expresso, criada na pandemia para enfrentar a redução da oferta de voos domésticos, que chegou a 70%.

Essa linha atende desde as rodovias até a demanda que seria aérea, de produtos como medicamentos, para entrega em até dois dias, dentro de um raio de 1.200 quilômetros a partir da cidade de São Paulo. A estratégia inclui viagens noturnas, utilizando dois motoristas.

A empresa investiu também em um hub aéreo exclusivo no aeroporto de Guarulhos, com acesso direto à pista de voo. O terminal consolida, paletiza e prepara a carga para ser transportada com maior eficiência e segurança. A companhia movimenta por via aérea mais de 1.000 toneladas por mês e a meta é dobrar o volume em um ano.

“Surfamos a onda do e-commerce porque temos uma série de ativos e usamos a conectividade entre eles para recebimento, armazenagem e distribuição dos produtos”, diz Ricardo Buteri, diretor comercial da Santos Brasil, prestadora de serviços portuários e logísticos. A empresa opera com três terminais de contêiner - em Santos, Vila do Conde (PA) e Imbituba (SC) -, um terminal de carga geral, em Imbituba, e um terminal de veículos em Santos.

A companhia conta também com uma operadora logística, a Santos Brasil Logística, que atua de forma integrada com os terminais, para atender o cliente em todas as etapas, do porto à porta. É a única prestadora de serviços portuários com logística integrada do porto ao e-commerce.
O e-commerce responde hoje por cerca de 10% do faturamento de suas operações em armazéns gerais. Graças à diversificação de operações e segmentos atendidos, a empresa manteve o faturamento da área de logística com pequena alteração, apesar da crise sanitária e econômica. No primeiro semestre, a receita bruta atingiu R$ 137,8 milhões, ante R$ 140 milhões em mesmo período de 2019.

A gestão customizada de estoques foi um dos serviços bastante demandado pelos clientes, para evitar que ficassem parados no porto os suprimentos importados destinados a fábricas que fecharam durante a quarentena.

Um dos clientes foi a Mercedez Benz, que dessa forma evitou também gastos com demurrage, valor cobrado pelo armador por dia de atraso no prazo previsto para devolução do contêiner. “À medida que as fábricas retomaram as operações, fomos entregando os estoques”, descreve Buteri.

O crescimento do e-commerce aqueceu também a procura por galpões logísticos. Na Log Commercial Properties, a procura por novas locações para atender ao comércio digital cresceu 100% entre abril e junho, em comparação com mesmo período de 2019. No primeiro semestre, a empresa registrou 230 mil metros quadrados novos alugados e a expectativa é atingir em 2020 desempenho recorde.

“Temos hoje a menor vacância do mercado, com 1 milhão de metros quadrados entregues, 95% dos quais locados”, diz Guilherme Trotta, diretor comercial da Log. A demanda tem sido puxada também pelos setores de alimentação e farmacêutico.

Na Tópico, que atua na venda e aluguel de galpões flexíveis, a demanda por galpões com cobertura de lona para e-commerce aumentou mais de 50% no primeiro semestre. “Nos últimos seis meses houve uma retomada na utilização de galpões, sinalizando um forte processo de expansão e de novos investimentos, especialmente fora dos grandes centros, como nas regiões Nordeste e Centro-Oeste, e no que chamamos de last mile”, diz Arthur Lavieri, CEO da Tópico. Com fábrica própria e CD em Embu das Artes (SP), a empresa conta com mais de 2,5 milhões de metros quadrados instalados.

Fonte: Valor Econômico - Suplemento Infraestrutura e Logística

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